Branding e Gestão da Cultura

Written by Nelson Pinheiro: From Cultural Management to Trends and Branding. www.creativecultures.letras.ulisboa.pt

Fotografia e composição da autoria de Nelson Pinheiro.

A questão sobre o futuro da construção das marcas no mundo apresenta-se como um desafio. A problemática de uma orientação global para a gestão de marcas, para começar, levanta dificuldades, tendo em conta as características culturais, entre outras, de cada geografia. A gestão de uma marca, mesmo que global, não pode ser uniforme na sua totalidade. Se as marcas possuem a capacidade, ou os recursos, de chegar a um maior número de indivíduos e de públicos, as diferentes naturezas de cada pedem uma análise e uma resposta, por vezes, específicas.

A liquidez e a fluidez (ver Bauman, 2000; Lipovetsky, 2009) que caracterizam as atuais estruturas socioculturais moldam as mentalidades, os comportamentos e os desejos dos indivíduos, impactando as dinâmicas de grupo, as características de pertença e os próprios mecanismos de construção de identidades. Estes são elementos fundamentais no papel da relação entre a marca e o consumidor.

O consumo simbólico (ver Baudrillard, 1993) tornou-se uma questão complexa. A desconstrução das narrativas da marca por parte do(s) seu(s) público(s) pauta a forma como cada um interpreta as mensagens e as associações em torno da constante construção de uma marca. Num mundo onde as imagéticas e os comportamentos — como elementos culturais complexos que se traduzem em objetos observáveis — estão em constante reconstrução e atualização, importa ter em consideração o ritmo cada vez crescente de mudança onde a efemeridade assume um papel preponderante. Aliás, ao nível do Estudo de Tendências, e da própria análise de fenómenos de consumo, muito autores sublinham a questão da mudança como uma palavra-chave para compreender as tendências (ver Vejlgaard, 2008; Higham, 2009; Raymond, 2010; Mason et al., 2015; Dragt, 2017) e o seu impacto na sociedade. Desta forma, as mentalidades emergentes, enquanto tendências socioculturais, geram mudanças que se materializam em sinais criativos associados a determinados comportamentos e expectativas do consumidor.

A gestão de marcas nos próximos anos poderá passar por uma análise mais profunda sobre as grandes macro e micro tendências que afetam a vida em sociedade. Apesar das várias tendências se traduzirem de forma diferente em cada geografia, existem determinados elementos do imaginário que são partilhados por um largo número indivíduos e que podem apresentar pistas e caminhos sobre a natureza das alterações sociais. As questões que marcam o espírito do tempo atual, tais como sustentabilidade e autenticidade, surgiram como mentalidades emergentes, com sinais tímidos, que foram sendo abordadas por várias marcas para gerar novos objetos e narrativas, tanto ao nível da comunicação como de produtos e serviços. A tradução aplicada destas mentalidades já é uma realidade atual e tenderá a se desenvolver com metodologias e conceitos mais sólidos que proporcionam resultados com maior sucesso.

O profissional de gestão de marcas, como já referi noutros trabalhos, terá de ter em consideração um perfil próximo do Chief Culture Officer, proposto por Grant McCracken (2011). Assim, o gestor de marcas terá de estar em sintonia com a(s) cultura(s), neste caso a cultura externa à própria instituição, de forma a compreender as dinâmicas por detrás das construções que permeiam os vários estilos de vida dos consumidores, no âmbito de um consumo material e simbólico e na própria forma de compreensão do mundo que rodeia cada indivíduo e cada grupo. Compreender a cultura permitirá contextualizar a própria liquidez e pluralidade de interesses de cada consumidor, mapeando macro orientações e agindo em conformidade para navegar a marca por entre a linha ténue que separa a identidade basilar do ADN da marca e as várias mudanças sociais que podem colocar em causa determinada estratégia ou ação. Caso os últimos anos sejam um indício, então o consumidor terá cada vez mais poder para exigir, co-criar, comunicar e julgar a marca. Se os três primeiros elementos podem sugerir oportunidades a explorar, o último é uma chamada de atenção para o gestor de marca. Neste sentido, importa também questionar o papel das tribos (ver Mafessoli, 1996), aqui entendidas como tribos urbanas, e dos grupos sociais como uma crescente força de influência sobre as marcas. Cabe ao gestor de marcas interpretar as várias forças que estão a agir sobre a sociedade e providenciar uma mensagem e uma resposta pertinente para os seus públicos e as suas necessidades.

Com base nestas questões, a antecipação das espectativas e do desenvolvimento dos comportamentos vão ser elementos a ter em consideração, mas eles servem uma base estratégica para a construção e a gestão de uma marca. A questão do propósito de uma marca (ver Sinek, 2009) será um elemento a considerar cada vez mais. A sua razão de existência, ou seja, a sua matriz materializada num propósito, permite criar uma relação emocional mais profunda com o consumidor e promover uma narrativa identitária capaz de articular as necessidades e os desejos dos públicos com a forma como a marca comunica e opera, gerando imaginários positivos e capacitando a marca para construir novas possibilidades.

BAUDRILLARD, Jean (1993). Symbolic Exchange and Death. Tradução de Iain Hamilton Grant. London: Sage.

BAUMAN, Zygmunt (2000). Liquid Modernity. Cambridge: Polity Press.

DRAGT, Els (2017). How to Research Trends. Amsterdam: Bispublishers.

HIGHAM, William (2009). The Next Big Thing. London: Kogan Page.

LIPOVETSKY, Gilles (2007). A Felicidade Paradoxal — Ensaio sobre a Sociedade do Hiperconsumo. Tradução de Patrícia Xavier. Lisboa: Edições 70.

MAFFESOLI, Michel (1996) [1988]. The Time of the Tribes: The Decline of Individualism in Mass Society. Tradução de Don Smith. London: SAGE.

MASON, Henry et al. (2015). Trend Driven Innovation. New Jersey: Wiley.

MCCRACKEN, Grant (2011). Chief Culture Officer. How to create a living, breathing corporation. New York: Basic Book.

RAYMOND, Martin (2010). The Trend Forecaster´s Handbook. London: Laurence King.

SINEK, Simon (2009). Start with Why: How great leaders inspire everyone to take action. New York: Penguin.

VEJLGAARD, Henrik (2008). Anatomy of a Trend. New York: McGraw-Hill.